segunda-feira, 19 de março de 2007

1.4 - Leito

"No quarto um leão morto no espelho."
(Rodolfo Miranda)


"Ali, onde uma língua inumerável
Insinuou-se em seu quarto com um lamento viril
Sua fé esvoaçou desfeita em torno dela
E a escuridão enfeitou as paredes com buquês de serpentes,
Um super-homem ou quase homem com narinas de fornalha
E mebros semelhantes a colunas
Que lhe pareciam aos sentidos embotados

O ladrão da adolescência,
Logo irreal ou semi-relembrado
O oceânico amante solitário
Cujos ciúmes ela não pode esquecer por nada deste mundo,
Fez seu leito perverso em sua suave
Noite, e dela se serviu o quanto quis

Gritando, sob a alva camisola, em meio aos cenários do luar
Até as marés que umas após outras a ouviam
Próximo e distante, ela anunciou o roubo do coração
Em seu corpo que assumia diversas idades,

Estuprador e noiva violentada
Celebrando ao seu lado
Todos os assaltos selados pelo sangue
E as bodas esvaídas em que não lhe coube nenhum papel lisonjeiro
Nem pôde compartir, apesar do seu orgulho, até o último
Sussurro e o repugnante bater de asas do solente sacerdote noturno,
Suas horas sacras e sacrílegas com a besta eternamente anônima."

(Dylan Thomas)